[TimorLesteStudies] Público - Timor-Leste: breve crónica de uma turbulência não anunciada

Carla Luís carlaluis at ces.uc.pt
Wed Dec 6 03:07:43 AEDT 2017


Dear all,
Please find below my article on Público about Timor-Leste:
https://www.publico.pt/2017/12/05/mundo/opiniao/timorleste-
breve-cronica-de-uma-turbulencia-nao-anunciada-1794775
As there are a few Portuguese readers in this list, fyi.
Cheers,
Carla Luís
Researcher - CES, Coimbra
<http://ces.uc.pt/en/ces/pessoas/investigadoras-es-em-pos-doutoramento/carla-luis>



OPINIÃO
Timor-Leste: breve crónica de uma turbulência não anunciada
<https://www.publico.pt/2017/12/05/mundo/opiniao/timorleste-breve-cronica-de-uma-turbulencia-nao-anunciada-1794775>

Surgem novamente as surpresas e a situação política em Timor está outra vez
em ebulição.

CARLA LUÍS
5 de Dezembro de 2017, 7:15

A União Europeia apresentou recentemente as suas conclusões sobre a Missão
de Observação Eleitoral (MOE) a Timor-Leste, nas legislativas de Julho. Em
síntese, há que reforçar o controlo do financiamento das campanhas, uma
lacuna que persiste há anos. Os *media *têm também de ser regulados, para
uma cobertura mais equilibrada das candidaturas. Por último, e de forma
alguma de menor importância, a Comissão Nacional de Eleições tem de ter os
seus poderes reforçados — invertendo o sentido da reforma legislativa de
2015-16, que reduziu ainda mais o poder deste órgão, acentuando a sua
dependência das instituições de poder.

As eleições legislativas de Julho foram livres, justas e democráticas,
salienta também a MOE. Este será talvez um dos pontos centrais a reter,
destacando o progresso assinalável que Timor tem vindo a fazer neste
sentido. O país tornou-se independente em 2002, após a Consulta Popular
levada a cabo pela ONU em 1999. Foi também a partir desta data que
sucessivas missões da ONU permaneceram no país. O objectivo era garantir a
paz, mas também (re)construir um país que emergia praticamente das cinzas.
Dotado de uma sociedade civil muito forte, nomeadamente instâncias e
autoridades tradicionais, o mesmo não se podia dizer do Estado democrático,
o qual urgia desenhar.

Em pouco mais de uma década, a conquista é notável. Desde muito cedo as
elites timorenses tiveram uma ideia bastante clara de que instituições
queriam para o seu país. Mesmo e apesar da presença da ONU, através de
sucessivos desdobramentos, muito cedo os timorenses deixaram-na num papel
de observador. As instituições foram desenhadas com intentos precisos. O
sistema semipresidencialista permite um equilíbrio, às vezes na ponta da
espada, entre o Presidente da República, o Governo e o Parlamento. As
eleições presidenciais são, assim, um passo decisivo para a futura formação
de um governo, advindo das eleições legislativas. O sistema é tão parecido
e tão diferente do português que a ideia de uma “geringonça” (no sentido
que veio a ter em Portugal) foi levada a cabo em Timor desde 2007, com
notável estabilidade. Inovação institucional foi coisa que não faltou, com
uma grande elasticidade — e sempre dentro dos limites de cada uma dessas
instituições.

As eleições legislativas, que tive oportunidade de observar, decorreram sem
sobressaltos. Tudo se afigurava como mais uma eleição normal, na vida
normal de um qualquer país. Não houve incidentes, o dia correu pacífico e
até à noite já havia gente na rua (facto não tão comum em países em
desenvolvimento). Por isso, nada para ver. Os resultados teriam de esperar
alguns dias e a vitória foi à tangente. Os dois maiores partidos alternavam
e o CNRT, de Xanana Gusmão, ficava agora em segundo, a pouca distância da
Fretilin, partido histórico em Timor — tendo embora ambos o mesmo número de
deputados. Não havia maioria absoluta e nos restantes partidos, incluindo
os mais pequenos, estaria tal soma de mandatos. Após anos na oposição, a
Fretilin havia apoiado o governo do CNRT a partir de 2015 (quem disse que
as instituições são rígidas?), e a expectativa era agora a do oposto.
Xanana Gusmão declarou, com naturalidade, que o partido não procuraria
formar governo aliado a partidos mais pequenos, e que assumiria o seu lugar
numa oposição construtiva.

No entanto, surgem novamente as surpresas e a situação política em Timor
está outra vez em ebulição. A Fretilin formou governo, com membros de
outros partidos (incluindo o anterior número dois de Xanana Gusmão, Agio
Pereira). No processo de negociações, com todos os partidos, foi perdendo
apoios formais, tendo apenas o Partido Democrático (PD) acedido a uma
coligação, minoritária. Na apresentação do programa do Governo ao
Parlamento, a oposição unida submeteu-o a votação e chumbou-o. Meses
depois, começam os rumores de moção de censura. A oposição, maioritária, já
a apresentou e exige a sua discussão — se aprovada, o Governo cai.

Entretanto Timor vive num impasse. O Governo toma posse, a sua lei orgânica
é promulgada e tenta passar-se uma imagem de naturalidade. Mas não há
orçamento e nem sequer programa de Governo, cuja segunda versão não foi
ainda submetida. Xanana Gusmão continua ausente do país (desde Julho) e, na
semana passada, os líderes dos partidos da oposição divulgaram imagens de
um encontro em Singapura, onde terão firmado apoio mútuo. Em Timor,
descontando os rumores, permanecem incógnitos os pontos deste dissenso, que
imobilizam o país. Os órgãos do Estado ficam num limbo paralisado, que
ameaça durar meses. Caindo o Governo, o Presidente da República terá de
decidir o que fazer: empossar um novo (composto por quem?), eleições
antecipadas (que só podem ter lugar depois de Janeiro) ou procurar novo
entendimento alargado?

Timor segue neste vazio, em que nada parece claro e em que até uma reunião
tão decisiva tem lugar fora do país. A substância do desacordo, seja ela
política ou de protagonismo, nunca é referida por nenhum dos
intervenientes. Apesar da pacatez das eleições, e da perspectiva da
normalidade democrática, houve de novo surpresas, que permanecem no ar, e
cujas motivações estão ausentes de debate público. Espera-se que a via
institucional permaneça, nisso incluindo a democracia, e sobretudo a
possibilidade de escrutínio público e transparência das decisões tomadas.
Só isso permitirá aprofundar a construção democrática, fazendo com que os
cidadãos confiem nas instituições que elegem, através do desempenho de um
papel claro no Estado e na arquitectura democrática.
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